O dono da Meta,Mark Zuckerberg — Foto: ANDREW CABALLERO-REYNOLDS / AFP/ 31-01-2024
GERADO EM: 13/01/2025 - 16:04
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Faz uma semana que o principal acionista da Meta,Mark Zuckerberg,anunciou ao mundo um cavalo de pau na direção da companhia. Cai o uso de empresas de checagem de fatos,entra um sistema em que a comunidade avalia o que é confiável ou não. A moderação diminuirá,e o espaço para debates sobre política aumentará. Nesse barata-voa geral,quem leu a cobertura da imprensa brasileira possivelmente não compreendeu alguns pontos essenciais. O primeiro,e mais importante,é que estas mudanças valem em sua maioria para os Estados Unidos. Os contratos de checagem,aqui no Brasil,na América Latina,na Europa e no além-mar geral seguem de pé. Este não é um detalhe. Na verdade,para entender o que se passa na cabeça de Zuckerberg,essa é uma das peças essenciais.
As plataformas digitais estão perdendo a briga da regulação. Pode parecer o contrário,mas não é verdade. Sim,estas são companhias grandes,ricas como jamais companhias o foram na História do capitalismo. São poderosas. Mas,aos poucos,o que os Estados nacionais estão descobrindo é que,quando querem regular,regulam. Isso ficou claro quando a Europa impôs suas novas regras. A Apple está tendo de se virar para permitir que usuários possam comprar apps em seus iPhones fora da loja da empresa. Na Austrália,decidiu-se que menores de 16 anos não podem ter contas nas redes sociais. Decidiu-se,também,que o ônus dessa garantia é das plataformas. E elas não têm o que fazer. Precisarão cobrar documentação para abrir as contas ou desenvolver alguma tecnologia que permita fazer o filtro. Ponto final. Elon Musk bateu de frente com o Supremo Tribunal Federal no Brasil,forçou o quanto pôde — e aí cedeu em tudo que o STF queria. A alternativa era não funcionar no país,um luxo ao qual o X não pode se dar.
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Este é,em essência,o problema de Zuckerberg. Não só dele,mas de todas as plataformas digitais. O lento consenso da necessidade de regulação está sendo alcançado. Não está claro ainda qual o melhor tipo de regulação,e o debate está aberto sobre que regulação é eficaz para combater que tipo de problema. Os debates são muitos. O que não é mais discutido é se governos conseguem regular. Sim,conseguem. Basta querer que o fazem. E isso está claro por uma única razão: todos os governos estão ganhando as brigas que compram. Essa é a razão de Zuck ter anunciado mudanças imensas,mas,no caso das de maior impacto,limitadas aos EUA. Ele não tem como bater de frente com a União Europeia. Ou mesmo com o Brasil. Perderia.
Este,portanto,é o jogo de Mark Zuckerberg: ele está propondo uma barganha para Donald Trump.
Ora,veja: o debate público americano foi dominado,na última semana,pela ideia de conquista do Canal do Panamá,da Groenlândia e do Canadá. Nenhuma das propostas é séria. Ou sequer plausível. Os EUA,com todo o seu poder militar,não foram capazes de controlar o Afeganistão ou o Iraque. Não foram capazes de conquistar o Vietnã,onde o exército adversário era uma guerrilha. Imagine o Canadá ou um país da União Europeia. Mesmo que uma guerra de conquista do pequeno Panamá fosse possível,o governo Trump precisaria de aprovação do Congresso,onde quase metade de deputados e senadores são da oposição. Se um pequeno número de republicanos votar contra em só uma das Casas legislativas,o que é esperado,as Forças Armadas não poderiam agir.
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Isso mesmo. Não poderiam agir sequer sob ordens do presidente. Donald Trump sabe disso. Só que parte essencial de seu método é a criação permanente de ruído. O ruído serve a este novo governo americano. Ele suga a atenção do debate público enquanto decisões que levarão ao desmonte do Estado serão tomadas. Decisões,aliás,muito mais complexas e também burocráticas. Portanto chatas de acompanhar. Trump precisa de ruído constante.
É para isso que serve a desinformação. Ela é parte eficaz da estratégia de Trump não tanto porque engane as pessoas,mas mais porque as distrai. Ele gera tantos debates absurdos simultaneamente,a maioria sem qualquer consequência,que aquilo que de fato é importante se perde. A arte de Trump é a do ilusionista que constantemente desvia o foco de seu público dos movimentos relevantes.
Pois Zuckerberg está oferecendo ao novo presidente suas plataformas para distrair à vontade o público americano. Em troca,pede que o peso do Estado americano seja usado para enfrentar Europa,Canadá,Austrália,e,sim,o Brasil. O governo dos EUA tem melhores condições de pressionar para evitar a regulação desses negócios americanos.
É a esperança de Zuck.